quarta-feira, 16 de julho de 2008

Ensaio sobre o desrespeito


Andrea tem razão. E mais. Não agüento – permitam-me a repetição – mais o desrespeito com que tratam jornalista em Goiânia. Vou falar daqui porque é a minha realidade, mas, certamente, não deve diferir muito em outras periferias do Brasil. É jornalista que destrata jornalista. É empresário que desrespeita jornalista. É fonte que desconsidera jornalista. É contratante que acha que jornalismo pode ser feito por qualquer um.
Vamos aos fatos. Semana passada uma grande amiga me recomendou um free-lancer. Não era nada grandioso, mas também não era um biquinho. Era o lançamento da nova sede de uma respeitada empresa de consultoria em recursos humanos. Liguei para a responsável – leia-se: a dona! -, falamos do trabalho e tal e fiquei de encaminhar em seguida orçamentos de espaços pagos onde ela gostaria de veicular também. Apurei que cada palestra dela custa 3 mil reais.
Ela só esqueceu – esqueceu, né?! – de perguntar quanto valeria o meu trabalho. Como não sou bobo nem nada, antes de orçar, enviei para o endereço eletrônico dela o valor do meu serviço. Era terça-feira. O evento ocorreria – deve ter ocorrido – na terça seguinte. Pouco tempo. Demanda mediana. Contato é contato. Mailing é mailing. Profissionalismo é profissionalismo. Respeito é respeito. E jacaré é um bicho.
Quarta-feira. Nem sinal de fumaça.
Quinta-feira, 17 horas, liguei para ela. Afinal, não perderia um trabalho desses por falta de insistência, né?!
“Oi, João. Até o final do dia eu vou te ligar para a gente negociar”.
“Ok”.
No dia seguinte, me liga a secretária da dita cuja para confirmar o recebimento do convite para a inauguração. Eu disse ter recebido. Até a mim não chegou. Bem como a contratante (?!) não deu a menor satisfação, não respondeu o e-mail, não mandou torpedo, não ligou, não mandou recado.
Não cobrei caro. Não cobrei barato. Estipulei o valor certo. Cobrei um preço que – como manda a lei do mercado – daria uma margem para baixar uns 200 reais no orçamento. Lembrei da Andrea na hora. Recentemente, ela se queixou comigo que jornalista goiano de redação não responde e-mail de assessor de imprensa. É fato. Eu, na condição de repórter, passei a dar feedback aos quilos de material recebidos a partir desta queixa.
Ah, e Andrea reclamou disso porque eu havia reclamado que me aconteceu o mesmo em outro episódio. Envio orçamento para contratante, ligo, deixo recado e fico na chapada. Quem dera fosse na dos Guimarães ou na dos Veadeiros. Mas é na chapada em caixa baixa mesmo.
Pô, galera, uma faculdade de jornalismo dura no mínimo quatro anos. É o mesmo tempo que estou no mercado profissional. E não me importa o tempo. Cada trabalho tem seu preço. O que importa são os resultados. Empresário goiano – tem colega jornalista que faz igual – acha que nós somos o quê? Nos oferecem merreca, abaixo das tabelas sindicais – que, convenhamos, já são subumanas -, pressionam horrores, geralmente demoram para pagar e por aí vai.
Queiram me desculpar, mas jamais me desvalorizei e não vai ser agora que vou fazer isso. Seria um auto-desrespeito e um desrespeito com a categoria. Por que essas coisas continuam acontecendo? Porque há quem pegue trabalhos por preços bem inferiores do que valem. Que permutam seu suor por produtinhos de grife.
Eu quero ter a minha grana para comprar a minha roupa onde eu quiser. Seja na Feira Hippie, na Osklen, na Daslu, na Daspu ou na Dosgay. É demais querer receber em dinheiro? É demais querer receber pelo meu trabalho? É demais querer resposta ao passar um orçamento? É demais clicar, sem custos, em “responder o e-mail”? É demais? É?
Olha, para trabalhar em troca de comida eu não precisaria ter saído da casa do meu pai, me sacrificar para cursar quatro anos de curso superior – pago minha faculdade, financiada, até o segundo semestre de 2013 -, fazer cursos, investir em línguas estrangeiras, assistir os lançamentos no cinema, ler tantos livros obrigatórios – o faria somente pelo prazer, então -, andar na moda (hahahahaha)...
Goiânia, em muitos segmentos, ainda me deprime.

4 comentários:

Aline Leonardo disse...

ô criança, desde quando vc é de Itapuranga? Engraçado, conheço um menino de lá que tem o seu sobrenome: o Clauber. Mas, deve ter uns 6,5 mil anos que não o vejo. Tá coberto de razão quanto ao nosso mundinho.
Bjos

Andrea Regis disse...

Faço coro: cansei! A-do-ro Goiânia, tenho orgulho das minhas origens, mas... Dá desânimo, vontade de mudar de profissão (adiantaria...? Quem sabe se fôssemos médicos. Ah, sim. Espera-se por eles durante horas, e sem reclamar!).
“Oi, João. Até o final do dia eu vou te ligar para a gente negociar”.
Ouvi isso recentemente. Situação idêntica. Eu aqui, cliente aí. Deve ter uns 4 meses. Até agora nada...
Beijo!

Fred Leão disse...

Eu sempre digo por aí "quem disse que jornalista tem dignidade?". Pelo visto isso não é tão brincadeira assim.

Marley Costa Leite disse...

Pois é meu amigo... Se nossa categoria fosse mais unida não teríamos esse tipo de problema. Bastaria se recusar a pegar o serviço e ter a certeza de que alguém não o faria por um valor vil...Na realidade somos nós mesmos quem nos desvalorizamos e acho que o seu procedimento foi ético, correto e principalmente amigo (da pessoa que o indicou, claro). Somos profissionais e não comadres para trocar favores. Demorei muito para aprender coisas que hoje eu faço questão de mostrar atalhos para os mais jovens... Beijos e muito sucesso em sua carreira!!!